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Chikungunya, uma doença incapacitante

Entenda melhor a Chikungunya e a situação no Ceará

A Chikungunya chegou ao Brasil em 2014, com o primeiro caso registrado no Amapá. O vírus já causou epidemias em Pernambuco e na Bahia e, em 2017, assusta o estado do Ceará: até o final de outubro, foram confirmados  96 mil casos, além de 126 óbitos.

E os números reais tendem a ser ainda maiores. É o que afirma o Dr. Ivo Castelo Branco, infectologista e coordenador do Núcleo de Medicina Tropical da Universidade Federal do Ceará (UFC). Uma das principais referências no assunto em todo o Brasil, Castelo Branco conversou conosco sobre a situação do CHIKV no estado.

Ele afirma que muitos casos não são registrados a tempo da publicação dos dados oficiais, que têm um delay de cerca de um mês. Segundo o infectologista, os números estão caindo, mas é preocupante a gravidade dos danos causados pela doença. Ele enfatiza ainda a importância de um combate integrado e assertivo ao Aedes aegypti.

Por que a Chikungunya atinge o Ceará com tanta intensidade até hoje?

Tem a ver com a presença do transmissor e com a nossa população estar receptível ao CHIKV. Primeiro veio a Dengue, depois a Zika e, de 2015 para cá, estamos tendo casos de Chikungunya, assim como aconteceu em Recife (PE) e Feira de Santana (BA). Como existe a presença do Aedes até hoje, isso tem indicado que as formas de controle do vetor não têm sido as mais eficazes.

Existe, então, uma deficiência no combate ao mosquito?

Não diria exatamente uma deficiência. Existe uma falta de controle assertivo, não só aqui, mas em todo o mundo. No Brasil, as campanhas contra o mosquito são cíclicas: começa-se a falar sobre o assunto no segundo semestre, quando chove no Sudeste. Aqui no Nordeste é diferente, todo o primeiro semestre temos uma epidemia.

Mas não acredito que exista um culpado. A população tem que ter consciência de que, do mesmo jeito que se combate ratos e baratas dentro de casa, deve-se combater o mosquito. Mas também não se pode simplesmente responsabilizar a população: os nossos governantes têm que orientar para que a população saiba como combater o mosquito de forma eficaz. E é importante lembrar que o modo de combate muda de acordo com o local. Portanto, precisamos conhecer as peculiaridades de cada região para orientar corretamente as pessoas.

E quais são as especificidades para combater o Aedes no Ceará?

Aqui é muito comum que as pessoas armazenem água em caixas, pois chove muito pouco. Houve uma campanha dizendo para não armazenar água, mas diante à situação isso é um sacrilégio. O correto seria orientar para que a população armazene a água de forma correta. Normalmente, onde falta água as pessoas armazenam, e o Aedes prolifera durante todo o ano.

Estamos começando aqui um trabalho com o aplicativo Aedes em Foco UFC. Por meio dele, a população consegue se comunicar melhor com os órgãos governamentais, o que auxilia em um mapeamento para o melhor controle do Aedes.

O que o senhor observa em relação à duração da Chikungunya? As sequelas são frequentes?

A Chikungunya é uma doença nova, e nós aprendemos acompanhando os pacientes e estudando as experiências em outros locais, como a Polinésia e algumas regiões do Caribe, que já sofreram surtos. Aqui, porém, vimos uma doença muito letal: em menos de um ano, já foram mais de 100 mortes no estado.

Na primeira semana, ela é muito parecida com a Dengue e com a Zika. 10% das pessoas conseguem controlar as dores articulares em duas ou três semanas, mas 80% sofrem por até três meses. Nos casos que duram mais de três meses, a doença começa a ser tratada como reumática, com sintomas que normalmente não encontramos em uma doença infecciosa. É como se causasse uma obstrução. Em muitos casos, a pessoa não consegue sequer abrir uma maçaneta.

Se o paciente tem alguma patologia pregressa, como doenças articulares ou diabetes, a situação é pior, podendo levar a dores ainda mais intensas e ao coma.

Mortes, sequelas, custos altos de tratamento e de afastamento das pessoas doentes… São muitos os impactos da doença. O que o senhor considera mais preocupante em relação à Chikungunya?

Ela é uma doença incapacitante, a pessoa se torna incapaz de fazer qualquer coisa. Você vê, por exemplo, um rapaz de 18 anos andando curvado como se tivesse 90 anos. Cerca de 10% das pessoas infectadas terão sequelas para o resto da vida – se pensarmos em uma epidemia de 100 mil casos, isso é muita gente que não consegue trabalhar, levar uma vida normal. E isso exige acompanhamento com fisioterapeutas e psicólogos, pois muitas vezes leva à depressão. Mesmo para 80% dos casos, que duram cerca de três meses, é preocupante. Imagine, por exemplo, um médico ou um trabalhador autônomo que fique parado durante todo esse tempo?

E isso tudo é evitável, é só não termos o Aedes aegypti. Por isso eu reforço que é muito necessário controlar o mosquito, e isso vem tanto do governo quanto de uma ação cidadã das pessoas, que devem tomar frente nesse combate.